domingo, 18 de novembro de 2012

A Troca


Drama pungente, baseado em fatos reais, A TROCA (2008) conta a história de uma mãe solteira da Los Angeles de 1928, que uma tarde, ao chegar do trabalho, se depara com o desaparecimento de seu filho de 9 anos.

Com a direção sensibilíssima e sempre bonita de Clint Westwood. o filme vai deixando cair vários véus, numa temática que abrange muito mais do que envolveria somente a história de uma mãe corajosa na busca de seu filho desaparecido.

É muito mais do que isso! Fala de pessoas de bem, capazes de enfrentar os desmandos de poderosos, pessoas que não se calam e que, juntas, conseguem realizar transformações na comunidade em que estão inseridas.

Clint vai desvelando um novelo intrincado, que começa com a busca do filho pela mãe, Christine Collins, vivida pela belíssima Angelina Jolie, e você começa a se estranhar com a polícia no momento em que ela lhes pede ajuda e eles lhe avisam que só buscariam depois de 24 horas, uma vez que “esses meninos costumam sair e voltar sem motivo” e o efetivo policial não deveria ser destacado para atender o que poderia ser uma travessura de garoto, pois “tinha assuntos mais importantes para cuidar”.

Para surpresa, porém, logo no início do filme a mãe é avisada de que seu filho fora encontrado, abandonado em um bar por um vagabundo. A mãe vai até uma estação de trem para receber o menino e se depara com todo o efetivo policial em festa, com a cobertura da imprensa local, e o chefe de polícia lhe pedindo que os elogie à imprensa.

Porém, desce do trem um menino que não era seu filho, Walter Collins. Mesmo afirmando que aquele não era seu filho, a mãe é coagida pelos policiais a leva-lo para casa, ao argumento de que os meses em que passara desaparecido o teriam feito perder peso e mudar de feições. Além do mais o menino se dizia ser Walter Collins e dava como endereço de casa o endereço da mulher, além de se afirmar seu filho e chama-la de mamãe.

Em casa, Christine reúne argumentos aptos a provar que aquele não era seu filho, pois tinha 8 cm. a menos do que a marca que tinha na parede, da última vez em medira Walter e era circuncisado, coisa que seu filho não era.

A polícia, entretanto, insiste em dizer que o stress do desaparecimento fez o menino reduzir o crescimento e que a circuncisão deve ter sido escolha do homem que o raptara.  Mais que isso, começa a afirmar que o que a mulher quer é se ver livre da responsabilidade de criar o filho, para poder se divertir e deixa-lo por conta do Estado.

O Reverendo Briegleb, da igreja presbiteriana, vivido pelo sempre ótimo John Malkovich, tinha um programa de rádio onde denunciava a corrupção policial abertamente e procura por Christine para lhe alertar sobre o grau de desmandos da polícia de Los Angeles. 

Orientada e apoiada pelo reverendo, Christine reúne provas escritas do dentista e da professora de Walter e procura a imprensa para declarar o que está acontecendo, mas antes que possa prosseguir em seu intento, tem seu internamento psiquiátrico decretado pelo chefe de polícia.

No hospital psiquiátrico, Christine se depara com várias mulheres internadas, como ela, pelo código 12. Descobre, então, que este é o código para confinar no sanatório mulheres que ousaram denunciar um policial, desde a prostituta que apanhava de um deles e pôs a boca no trombone, até esposas agredidas e por ai vai.

Em paralelo, e por meio de um excelente roteiro, descortina-se a descoberta de um serial killer canadense que havia assassinado mais de 20 garotos no sítio onde morava. A foto de vários meninos desaparecidos é reconhecida por um jovem que fora coagido a ajudar o assassino, entre eles a foto de Walter Collins, do caso “solucionado pela polícia”.

Cresce a expectativa pela resolução do filme, o que está longe ainda de acontecer, pois antes do final, ainda podemos entrar em contato com sentimentos diversos, como a corruptibilidade e a honra, a esperança e a coragem, o amor materno, a solidariedade, enfim, de forma dramática Clint Westwood. vai nos conduzindo por essa história de luta, permeada pela dor íntima de uma mãe, que acaba por transformar toda a cidade em sua estrutura de consciência coletiva e transformação das instituições.

Christine é resgatada do hospício e, a seguir, consegue fazer com que todas as mulheres código 12 sejam retiradas de lá. O serial killer é encontrado, julgado e enforcado. Os policiais corruptos e o prefeito são exonerados. E, quando você pensa que o filme vai terminar, Clint volta a focar na busca da mãe pelo filho, que, de repente se descobre, pode estar vivo.

Destaque para cena em que Christine é autorizada a visitar o assassino na prisão (a primeira mulher em 30 anos que teve permissão para tanto) um dia antes de seu enforcamento, pois ele enviara um telegrama dizendo que queria contar a verdade sobre se Walter fora morto ou não. 

Ao final, você descobre que Clint só usou a história real de Christine para recheá-la de motivos sociais e humanos. Termina o filme e sobe o plano sobre Christine atravessando a rua, com a informação de que ela nunca deixou de procurar por seu filho. A gente não reencontra Walter Collins nesse filme, mas dá de cara com muitas verdades interessantes que, a despeito de terem se passado em 1928, estão, mais do que nunca, muito presentes hoje, nas sociedades contemporâneas.

Duas curiosidades: 
    1. Christine era supervisora de telefonistas e é muito engraçado ver como o modelo de call center que chegou aqui no Brasil nos anos 90, já funcionava exatamente assim nos EUA em 1928. Impagável!
      2.  Como americano gosta de terminar o filme subindo o plano, não?

Quer saber o que mais? A música é linda, cheia de sax e foi composta pelo próprio Clint Westwood. Gentem, esse cara tem que ter chulé!





domingo, 4 de novembro de 2012

Elefante Blanco (2012)


Leonardo Boff (@LeonardoBoff) já anunciara Elefante Blanco, tempos atrás, indicação que hoje foi reforçada por Wilson Ramos Filho.

Com Ricardo Darín, "Elefante Branco" tem como temática os problemas vividos pelos moradores de uma favela de Buenos Aires, a Villa Virgen, nos anos 70, num repressivo cenário de tráfico, miséria e abandono.

Focado nos usuários de crack, sobretudo nos muito jovens, o diretor Pablo Trapero nos conduz a uma angustiante incursão por Villa Virgen através dos personagens de Ricardo Darín e Jérémie Renier, que vivem Julián e Nicolas, dois teólogos da libertação tentando fazer algo em favor da comunidade local, e da assistente social Luciana, vivida por Martina Gusman.

Julián (Darín) comanda os trabalhos com o auxílio de Nicolas, o padre francês vivido pelo ator belga Jérémie Renier, que, recém-escapado de um massacre junto aos índios amazônicos, vive um momento de intensa crise deflagrada pelo trauma e as culpas por ter sobrevivido em meio a tantos mortos.

Libertários, os teólogos se confessam e aconselham mutuamente em suas crises de fé, e se percebe que Julián está doente e pretende preparar Nicolas para substituí-lo na difícil liderança dos trabalhos junto á comunidade.

É belo o romance em que o padre Nicolas se enreda com a assistente social Luciana (Martina Gusman), que alivia as dores de ambos, ainda que aquele não pretenda desistir de sua vocação.

O filme é dedicado ao padre Carlos Mugica, cujo assassinato nos anos 70 até hoje não teve os motivos desvendados às claras, e traz emocionantes passagens verídicas sobre a história de Mugica.

O destaque de Trapero vai para a capacidade do padre Julián, que mesmo cansado e por vezes até desesperançado, opta por realizar seu trabalho no combate à pobreza e à miséria social, enfrentando tudo e todos, desde o alto comando da própria igreja católica, até as pressões dos grupos de traficantes, que refletem muito no comportamento dos moradores locais, e, também às fortes pressões policiais.

Elefante Branco é uma construção imensa, que seria um hospital anos antes, mas que, abandonada, está em ruínas e serve de abrigo e acolhimento para jovens usuários de crack que são recebidos pela equipe de protagonistas, seja porque querem ajuda, seja porque ali se refugiam para tentar salvar-se da morte certa que os espera nos limites da Villa Virgen.

Entre tiroteios constantes, e as feridas sociais expostas por Trapero, o filme se desenrola numa toada nem tão atormentada, como em Carancho (2010), mas que traz a grata surpresa de ter na trilha sonora a irreverente música “Las cosas que no se tocan”, da banda argentina “Intoxicados”, ponto em que Trapero acertou a mão e até contrapesa com alguma pasmaceira que permeia o roteiro.
O final de Julián tem um gosto de Mugica. A vida segue para Nicolas e Luciana que, parece, continuarão firmes na ideologia da libertação.

Darín é sempre Darín, ainda que não esteja assim tão Darín em Elefante Blanco.

A última cena é tipicamente de Trapero, ou seja, de repente acaba e ai você fica muito feliz que ente a música dos “Intoxicados:


Me gustan las chicas, me gustan las drogas 
me gusta mi guitarra, James Brown y Madonna 
Me gustan los perros, me gusta mi estéreo 
me gusta la calle y algunas otras cosas 
pero lo que más me gusta 
son las cosas que no se tocan 
Me gusta el dinero para comprarme lo que quiero 
me gustan las visitas para matar el tiempo 
me gusta esta luz, me gusta esta sombra 
me gustan los grupos que no están de moda 
me gustan los autos, los trenes, los barcos 
me gusta que al que espero no tarde más de un rato 
me gusta el arroz, me gusta el puchero 
me gusta el amarillo, el rojo, el verde y el negro 
pero lo que más me gusta 
son las cosas que no se tocan 
Por eso me gusta el rock.