quarta-feira, 20 de junho de 2012

Dançando no Escuro

Lars Von Trier é minha paixão definitiva (e não me venha Karyn Cavalheiro dizer que ela é a número 1!)! Mas, como a Karyn comentou aqui outro dia que se apaixonou por ele em DANÇANDO NO ESCURO (2000), vai esse post em homenagem à amiga, que está se recuperando de uma rubéola.


Revisitando, esta obra prima,  é uma espécie de "musical antimusical"; um musical lúcido, com Björk interpretando Selma, a imigrante operária que, quase cega, junta dinheiro para operar os olhos de seu filho, a fim de livrá-lo da doença congênita que acometeu a todos os de sua família. 


Apaixonada e alucinada por musicais de Hollywood, Selma alterna o trabalho na fábrica com aulas de teatro, tentando esconder o declínio de sua visão. Porém, a sua vida muda radicalmente quando é acusada injustamente de um crime.


Como tudo em Lars, a carga psicológica é profunda e a alma humana exposta entre canções e a incrível interpretação de Björk e participações da grande Catherine Deneuve e do lendário Joel Grey (Cabaré).


Eu recomendo!

terça-feira, 19 de junho de 2012

Coco Chanel & Igor Stravinsky


Coco Chanel & Igor Stravinsky (2009)

O perfume Chanel Nº. 5 tem o aroma do profundo amor vivido entre Coco e Igor.


O filme é impecável! Inicia por nos mostrar Coco (Anna Mouglalis), bem jovem e de cabelos longos, ainda vivendo seu amor por Boy Capel (Anatole Taubman), descobrindo Stravinsky (Mads Mikkelsen) em um concerto mal sucedido na França.


13 anos mais tarde, após a morte de Body em um desastre automobilístico, já de cabelos curtos, Coco o leva para morar em seu bangalô, juntamente com Katarina Stravinskaya (Elena Morozova), sua esposa doente, e os 4 filhos do casal, a fim de que pudesse criar sua música com tranquilidade, uma vez que ele se refugia na França, ao final da Revolução Russa.


A Sagração da Primavera está para ser executada, e o que se assiste no filme é toda a tensão criativa que a precede, toda a atração elétrica que há entre os dois, permeada pelo triângulo com a doente Katarina, os conceitos morais e as diferentes culturas trazidas em si pelos dois amantes num período pós guerra.


Uma história muito diferente de amor. Não pense que vai encontrar aqui o amor romântico. Não mesmo! O que se dá aqui é envolvimento de deuses criativos e amorais! Um amor carnal que transcendeu a carne e se tornou qualquer coisa de imortal e profano, cujos filhos foram deixados ao mundo por ambos: a música de Stravinsky e as criações de Chanel.


Destaque para Elena Morozova, que vive a erudita camponesa esposa de Stravinsky com uma convicção e uma dignidade medonhas!


Eu superhipermegarecomendo!

domingo, 17 de junho de 2012

Melancholia

Lars Von Trier é um signo psicanalítico ambulante e, como tudo nele tem um significado, eu me atreveria a dizer que não foi por acaso a escolha de Kiefer Sutherland, o corajoso Jack Bauer de 24 Horas, para viver o frágil e covarde personagem masculino neste filme (pensando bem, todos os filmes de Lars, têm um homem nessa posição).



Mas, sobre o filme, o êxtase começa com as cenas já, dos primeiros 10 minutos, orquestradas pela íntegra do prólogo da ópera Tristão e Isolda, de Richard Wagner. Vários quadros em câmera super lenta onde somos apresentados às irmãs Justine (Kirsten Dunst), a depressiva que não consegue encontrar alegria nem no dia de seu casamento, e Claire (Charlotte Gainsbourg), a obcecada mãe de um garotinho e dependente esposa do milionário John, apaixonado por astronomia, cujo papel secundário na trama é interpretado por Kiefer Sutherland.


Ao final do prólogo de Wagner, um cavalo cai em silêncio (isso mesmo! Um cavalo!) anunciando o fim do mundo.


Desenrola-se o enredo com a cerimonia de casamento de Justine, no castelo de John (que parece ser o mesmo cenário do último concerto de Herbert Von Karajan: http://www.youtube.com/watch?v=WPUT-LDo_nY).

 

Justine não está dando a mínima para o ritual minuciosamente planejado pela irmã Claire e fartamente patrocinado pelo cunhado John - Justine chega a se oferecer para colocar o sobrinho para dormir, somente para se afastar da festa e tirar uma soneca, depois, tomar um banho de banheira, entre outras coisas, que incluem até transar com o estagiário de publicidade que fora colocado em seu encalço pelo dono da agência, que dera de presente de casamento a Justine a promoção para o cargo de diretora.


Justine não liga a mínima para os rituais e cerimonias; para ela nada faz sentido e a assusta a obrigação que lhe impõem: ser feliz!


Seu casamento termina na mesma noite da cerimônia e começa a segunda parte do filme, onde se foca na passagem do planeta Melancholia muito próximo da terra.


Na segunda parte do filme, a certa altura, invertem-se os papéis: a depressiva Justine encontra uma incrível segurança na possibilidade do mundo se acabar e a controladora Claire mergulha no pânico, nervosismo e insegurança. Este é o grande trunfo do enredo e é difícil não querer premiar as duas como atrizes principais!


A personagem Justine é, declaradamente, o alterego de Lars Von Trier - teria sido vivida por Penelope Cruz, se ela não tivesse preferido filmar Piratas do caribe IV (bem feito pra ela!); o filme, aliás, surgiu de uma conversa entre Lars Von Trier e Penélope Cruz.


Lars declarou que sua moralidade foi influenciada pelo romantismo alemão, o que o colocou num posto especial da lista de marginalidade hollywoodiana.
A cena final nos coloca num estado tal, de arrebatamento e êxtase, nos integrando ao filme, fazendo com que dele passemos a fazer parte, tanto que... Não sei, mas acho que enquanto eu viver jamais conseguirei me desligar desse momento! O fim do mundo!


Aliás, tenho cá pra mim que meu amado Lars Von Trier me cochichou aos ouvidos, bem baixinho, e romanticamente: "Tânia, ouça, o fim do mundo é não encontrar alegria em viver... Ouça, o fim do mundo é a covardia masculina... Ouça..."


Listen: Open your ears, open your mind, open your heart...



Ophelia de John Everett Millais - imagem recorrente nos filmes de Lars e filmada ipsis literis, em Melancholia. 

sábado, 16 de junho de 2012

Jornada da Alma




Outro dia postei aqui The Dangerous Method (sobre o relacionamento entre Jung, Sabina Spielrein e Freud) e Lucimara Fernandes nos advertiu: “Para saberem melhor da relação de Sabine com Jung, é mais fidedigno o filme ‘Jornada da Alma’...".

PRENDIMI L’ANIMA (2002) de fato, é um filme focado na história da fantástica vida da genial russa Sabina Spielrein, e Jung acaba ocupando um afetivo e emocional plano de fundo (Freud nem aparece) nesta emocional obra do diretor italiano Roberto Faenza.

A atriz Emilia Fox (O Pianista), mais uma vez ofereceu uma espetacular atuação, marcante e impressionante! Difícil “se livrar” de Sabina Spielrein nos momentos seguintes ao final do filme.

O ator Iain Glen (A Dama de Ferro) construiu um Jung fascinante e humano em suas dúvidas e angústias que o aprisionavam num redemoinho de emoções.

Entretanto, Faenza parece ter se preocupado muito mais com a história romântica e aspectos biográficos de Sabina Spielrein, do que com questões psicanalíticas mais aprofundadas.

Destaque para a cena em que Jung e Sabina vão à Ópera e Jung não controla o choro na cena final de Tristão e Isolda; se retira para o saguão do teatro, seguido por Sabina, onde se senta para chorar. Sabina senta-se ao lado dele, pega suas mãos e lhe pergunta por que ele está tão frio. Jung, chorando de soluçar, responde: “Eu estava tão contente” e Sabina pergunta: “O que aconteceu?” e Jung exclama, arrebatado: “Maldita Felicidade!”

Ao fundo, ouve-se a melodia do último ato de Tristão e Isolda.

A trilha sonora, aliás, é conduzida para nos emocionar.  Tum Balalaika traduz a essência da fabulosa russa Sabina Spielrein, que chegou histérica até Jung; foi curada por ele e a ele curou; a ele amou e por ele foi amada, mas retirou-se da cena social da vida de Jung, constituiu sua própria família e retornou para a Rússia onde atuou como psicanalista e contribuiu enormemente na área do desenvolvimento infantil, além de ter passado por suas mãos ninguém menos que o pequeno tirano, Stalin.

As referências aos poetas russos Boris Pasternak e Mayakovsky também nos colocam em estado de emoção.

Lamentavelmente, Sabina Spielrein foi fuzilada com sua filha (há informações fora deste filme de que seriam 2 filhas) pelos nazistas em 1942.

O nada ortodoxo romance havido entre Jung e Sabina, só veio a público em 1977, com a localização de seu diário e de cartas trocadas entre ela, Jung e Freud.

O filme é belo, mas muito emotivo... No meu modo de sentir, DangerousMethod traz mais signos para desvendar. Mas é um belo filme, eu recomendo!

Violeta se fue a los cielos


Gente, que personalidade tinha essa mulher! O diretor Andrés Wood, que também participou da elaboração do roteiro, com a colaboração de Ángel Parra, o filho de Violeta que também é músico, nos mostra uma mulher que sofreu, viveu e amou intensamente, alcançando reconhecimento mundial como artista.

Com locações no Chile, na Argentina e na França, VIOLETA SE FUE A LOS CIELOS (2011) foi o representante chileno indicado para concorrer ao Oscar (pena que acabou não ficando entre os concorrentes), mas levou o Goya de 2012 na categoria de Mejor Película Iberoamericana.


Sua infância na provincia de Ñuble, sua relação com o complicado e sensível pai músico e professor (a mãe, índia, parece ter morrido cedo), a perda de uma filha bebê quando estava viajando para a Polônia, a pobreza, suas andanças com o filho Ángel pelo interior do Chile a buscar canções populares chilenas para impedir que fossem esquecidas, sua visita aos mineiros chilenos, com um circo, onde Violeta cantava com sua irmã, sua exposição de quadros e tapetes no Louvre, a filha Carmen Luisa, a tenda construída em um terreno doado pelo prefeito para que ali ela pudesse viver e mostrar sua arte e a grande paixão pelo suíço Gilbert Favre, tudo com a forte interpretação de Francisca Gavilán e permeado por uma entrevista que Violeta deu à televisão argentina, em 1962.


Belíssimas canções de Violeta Parra interpretadas no filme, pela atriz Francisca Gavilán, só que, neste particular, minha frustração foi imensa, pela falta de Gracias a la Vida e Vivan los Estudiantes.

Eu não sabia que era dela Volver a los 17!

Fiquei, também, me perguntando, em que momento de sua vida Violeta deu Gracias, pois no filme não conseguimos localizar sequer um momento de bonança e ventura que não tenha sido curto demais para agradecer...

Também me perguntei se o "cuando miro al fondo de sus ojos claros" Teria sido para os verdes olhos de Gilbert, uma vez que o filme se calou sobre todos os outros amores de Violeta Parra.

Uma mulher imensamente singular. Terna e revoltosa ao mesmo tempo, com um senso incrível de amizade e solidariedade, na entrevista à tv argentina, o entrevistador lhe pergunta se, como estava indo para a Polônia, ela era comunista. Violeta, como Che, responde: "Siiiim, eu sou tão comunista que quando eu me corto o meu sangue sai vermelho!", ao que o entrevistador responde: "Mas o meu sangue também sai vermelho, Violeta!"; ela, então, se levanta e aperta a mão do entrevistador dizendo: "Oh, como vai, camarada?"

A interpretação da música Gavilán, poucos minutos antes do suicídio, após o fim do romance com Gilbert, bem mais jovem que ela, é um grito de revolta contra tudo o que oprime e reprime: choca, pela crueza e pela dor.

Eu recomendo, muito!

domingo, 10 de junho de 2012

A Dangerous Method


UM MÉTODO PERIGOSO (2012) de David Cronenberg. “Às vezes temos que fazer algo imperdoável, só para poder continuar vivendo” é a última frase do filme, saída da boca de Carl Jung, vivido por Michael Fassbender, em um momento premonitório, cujo relato de um sonho apocalíptico, confessado à colega (e ex-amante) Sabina Spielrein, anuncia os terrores sofridos pela Europa nazista.

O roteiro é de Christopher Hampton a partir de sua peça “The Talking Cure” e do livro “A Most Dangerous Method” de John Kerr, e nos transporta para episódios havidos entre Freud e Jung entre 1906 e 1914, com foco nas divergências entre ambos e, sobretudo, na relação de Jung com a sua paciente russa, Sabina Spielrein.

Jung nega Freud (Viggo Mortensen) após ter curado a histérica Sabina (Keira Knigthley) com seu método, transgredindo-o em um envolvimento amoroso e lascivo com sua paciente, estudante de medicina que vem a se tornar uma conceituada psicanalista.

Antes do envolvimento amoroso entre Jung e Sabina, quando Jung apenas a tratava como paciente, Freud, sabedor do quanto Jung poderia estar desejando Sabina, lhe envia, por uns tempos, seu paciente Otto Gross, também psicanalista (ou, como preferia Freud: “psicoanalista”). Freud escreve a Jung sobre Otto Gross, que continuava valendo a definição do pai de Otto sobre ele, na infância: “Cuidado com Otto, ele morde”.

De fato, durante o curto período em que está aos cuidados de Jung, o caótico Dr. Otto desperta nele urgente senso se liberdade ("se tem uma coisa que aprendi em minha curta vida é isso: nunca reprima nada!"); Otto Gross abominava a monogamia e se envolvia sexualmente com suas pacientes na fase da transferência, chegando até a confessar que ajudou uma delas a se suicidar, não sem antes ter tido relações sexuais com ela.

Uma das melhores coisas do filme é a passagem de Otto Gross pelo “divã” de Jung!

Mais tarde Freud escreve a Jung que talvez não devesse ter lhe enviado Gross, mas, a sensação que fica é de que para Freud tudo foi um grande experimento. Fica também uma suspeita de que Freud tinha inveja de Jung, o bem casado Jung, o protestante Jung, o ariano Jung...

Há textos e cenas que dão tal indício, como a cena em que, mais tarde, após terminada a terapia e a relação entre Jung e Sabina  Spielrein, em colóquio profissional entre Freud e Sabina a respeito da monografia dela, quando Sabina faz qualquer referência ao trabalho de Jung, Freud lhe adverte para tomar cuidado com os arianos (Freud e Sabina eram judeus, Jung não.)...

Bem antes disso, quando Jung visitara Freud em Viena, antes de romperem, há uma cena em que Freud diz a Jung: “Todos nós, em nosso círculo psicanalítico aqui em Viena, somos Judeus” e, após Jung ter respondido: “Eu não vejo que diferença isso faz”, Freud arremata: “Se me permite, essa é uma observação especialmente protestante”.

Doutra feita, quando Jung diz a Freud que “felizmente a minha esposa é extremamente rica”, Freud se sente visivelmente incomodado, assim como quando, mais tarde, em viagem que fizeram juntos, Freud aparenta algum desconforto quando Jung pega o caminho da primeira classe no navio, porque a esposa, que fizera as reservas, escolhera um camarote para a viagem, ao tempo em que Freud pega o caminho da segunda classe.

O filme de Cronenberg tem sido criticado como burocrático e superficial, mas, talvez a crítica não tenha se dado conta desses aspectos, eu diria interessantíssimos, a respeito da relação e rompimento entre Freud e Jung, a quem aquele chegou a querer fazer sucessor, mas depois passou a criticar o “misticismo”.

Quem se atreve a analisar a inveja de Freud por Jung? Certamente que eu não! Otto Gross disse: "Acho que a obsessão de Freud com o sexo tem a ver com o fato de que ele nunca faz sexo."

Assista o filme e analise você mesmo. Eu recomendo!